Atenção: As questões de números 1 a 12 referem-se ao texto que segue.
Sobre a crença e a ciência
A pergunta que mais me fazem quando dou palestras é se acredito em Deus. Quando respondo que não acredito, vejo um ar de confusão, às vezes até de medo no rosto das pessoas. “Mas como é que o senhor consegue dormir à noite?”
Não há nada de estranho em perguntar a um cientista sobre suas crenças. Mesmo o grande Newton via um papel essencial para Deus na natureza: Ele interferia para manter o cosmo em xeque, de modo que os planetas não desenvolvessem instabilidades e acabassem todos amontoados no centro, junto ao Sol. Porém, logo ficou claro que a natureza podia cuidar de si mesma. O Deus que interferia no mundo transformou-se no Deus criador: após criar o mundo, deixou-o à mercê de suas leis. Mas, nesse caso, o que seria de Deus? Se essa tendência continuasse, a ciência tornaria Deus desnecessário? Foi dessa tensão que surgiu a crença de que a agenda da ciência é roubar Deus das pessoas.
Eu conheço muitos cientistas religiosos que não veem qualquer conflito entre a sua ciência e a sua crença. Para eles, quanto mais entendem o Universo, mais admiram a obra do seu Deus. (São vários) Mesmo que essa não seja a minha posição, respeito os que creem. A ciência se propõe simplesmente a interpretar a natureza, expandindo nosso conhecimento do mundo natural. Sua missão é aliviar o sofrimento humano, aumentando o conforto das pessoas, desenvolvendo técnicas de produção avançadas, ajudando no combate de doenças. O problema se torna sério quando a religião se propõe a explicar fenômenos naturais: dizer que o mundo tem menos de 7.000
anos ou que somos descendentes diretos de Adão e Eva é equivalente a viver no século 16 ou antes disso. A insistência em negar os avanços e as descobertas da ciência é, francamente, inaceitável.
Podemos dizer que há dois tipos de pessoa: os naturalistas e os sobrenaturalistas: estes veem forças ocultas por trás dos afazeres dos homens, escravizados por crenças inexplicáveis, e aqueles aceitam que nunca teremos todas as respostas. Mas, em vez de temer o desconhecido, os naturalistas abraçam essa ignorância como um desafio, e não uma prisão. É por isso que eu durmo bem à noite.
(Adaptado de Marcelo Gleiser, cientista e professor de física
teórica. Folha de S. Paulo, 28/03/2010)
A afirmação que NÃO constitui um argumento utilizado pelo autor na defesa de suas convicções é: