Atenção: As questões de números 11 a 15 referem-se ao seguinte texto.
Homens
Deus, que não tinha problemas de verba, nem uma oposição para ficar dizendo “Projetos faraônicos! Projetos faraônicos!”, resolveu, numa semana em que não tinha mais nada para fazer, criar o mundo. E criou o céu e a terra e as estrelas, e viu que eram razoáveis. Mas achou que faltava vida na sua criação e – sem uma ideia muito firme do que queria – começou a experimentar com formas vivas. Fez amebas, insetos, répteis. As baratas, as formigas etc. Mas, apesar de algumas coisas bem resolvidas – a borboleta, por exemplo –, nada realmente o agradou. Decidiu que estava se reprimindo e partiu para grandes projetos: o mamute, o dinossauro e, numa fase especialmente megalomaníaca, a baleia. Mas ainda não era bem aquilo. Não chegou a renegar nada do que fez – a não ser o rinoceronte, que até hoje Ele diz que não foi Ele – e tem explicação até para a girafa, citando Le Corbusier* (“A forma segue a função”). Mas queria outra coisa. E então bolou um bípede. Uma variação do macaco, sem tanto cabelo. Era quase o que Ele queria. Mas ainda não era bem aquilo. E, entusiasmado, Deus trancou-se na sua oficina e pôs-se a trabalhar. E moldou sua criatura, e abrandou suas feições, e arredondou suas formas, e tirou um pouquinho daqui e acrescentou um pouquinho ali. E criou a Mulher, e viu que era boa. E determinou que ela reinaria sobre a sua criação, pois era a sua obra mais bem acabada.
Infelizmente, o Diabo andou mexendo na lata de lixo de Deus e, com o que sobrou da Mulher, criou o Homem.
*Le Corbusier = Importante arquiteto francês
(Luis Fernando Verissimo. As mentiras que os homens contam. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001)