A memória ajuda a definir quem somos. Na verdade, nada é mais essencial para a identidade de uma pessoa do que o conjunto de experiências armazenadas em sua mente. E a facilidade com que ela acessa esse arquivo é vital para que possa interpretar o que está à sua volta e tomar decisões. Cada vez que a memória decai, e conforme a idade isso ocorre em maior ou menor grau, perde-se um pouco da interação com o mundo. Mas a ciência vem avançando no conhecimento dos mecanismos da memória e de como fazer para preservá-la.
Pesquisas recentes permitem vislumbrar o dia em que será uma realidade a manipulação da mente humana. Isso já está sendo feito em animais. Cientistas brasileiros e americanos demonstraram ser possível apagar, em laboratório, certas lembranças adquiridas por cobaias. Tudo indica que as mesmas técnicas podem ser usadas também para conseguir o efeito inverso: ampliar a capacidade de reter fatos e experiências na mente. Há pouco tempo pesquisadores da Universidade da Califórnia detalharam como as proteínas estão relacionadas ao surgimento de novas lembranças nos neurônios e à modificação das já existentes.
Como ocorreu com o DNA no século passado, os códigos fisiológicos que regulam a memória estão sendo decifrados. A neurociência é um campo tão promissor que, nos Estados Unidos, nada menos que um quinto do financiamento em pesquisas médicas do governo federal vai para as tentativas de compreender os mecanismos do cérebro. Os estudos sobre a memória têm um lugar destacado nesse esforço científico. Afinal de contas, mantê-la em perfeito funcionamento tornou-se uma preocupação central nas sociedades modernas, em que dois fenômenos a desafiam: o primeiro é a exposição a uma carga excessiva de informações, que o cérebro precisa processar, selecionar e, se relevantes, reter para uso futuro; o segundo é o aumento da expectativa de vida, que se traduz numa população mais vulnerável a distúrbios associados à perda de memória.
Um dos caminhos investigados pelos cientistas para deter as degenerações que resultam em perda mnemônica é induzir a produção de novos neurônios - a neurogênese. Até pouco tempo atrás, acreditava-se que as células do cérebro não se regeneravam. Esse mito foi derrubado e hoje se sabe que em algumas estruturas cerebrais o nascimento de células nervosas é um fenômeno comum. O experimento indica que, se os cientistas conseguirem estimular de maneira controlada a neurogênese, poderão aplicar essa técnica tanto para compensar a morte de células causada por uma doença degenerativa como, em tese, para melhorar a capacidade de memorização de uma pessoa saudável. Esse será, certamente, um dia inesquecível.
(Diogo Schelp. Veja. 13 de janeiro de 2010, pp.79-87, com adaptações)
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