Afinal, a tortura funciona ou não funciona? O existencialista Jean-Paul Sartre disse – e, nisso, estava certo – que a tortura era o mal do século XX. Morto em 1980, Sartre não viveu para testemunhar as tentativas às vezes pouco sutis de promover a tortura ao status de mal menor do século XXI. [Nos Estados Unidos] a questão acabou ganhando o enfoque da eficácia em decorrência da disputa política. A maioria dos republicanos defende o combate ao terror deflagrado pelo presidente George W. Bush, cujo governo legalizou as chamadas “técnicas aprimoradas” de interrogatório. Entre elas, inclui-se a “simulação de afogamento”, tortura antiga, documentada pela primeira vez no século XIV, e aplicada com requintes de profissionalismo na Inquisição espanhola. Em geral, os republicanos consideram que as “técnicas aprimoradas” foram úteis para selar a vitória americana sobre a Al Qaeda e descobrir o esconderijo de Bin Laden.
A maioria dos democratas, que hoje se opõem às políticas antiterror de Bush, mas nem sempre o fizeram no calor da hora, acha que as “técnicas aprimoradas” não passam de eufemismo para a tortura – no que estão cobertos de razão. E alegam que a vitória sobre a Al Qaeda e a morte de Bin Laden não têm nada a ver com a tortura de suspeitos, e sim com anos de trabalho minucioso de inteligência. [...]
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As democracias ocidentais – e os Estados Unidos entre elas, é claro – são moralmente superiores aos terroristas da Al Qaeda e seus
protetores. Elas atuam sob o império da lei, sob a égide de uma Constituição, dão satisfação à opinião pública e, flagradas no erro, abrem investigações, punem os infratores e tentam corrigir o rumo. Soldados americanos torturaram guerrilheiros vietcongues. Foram processados e punidos. A França pagou um alto preço pelo uso da tortura na guerra da Argélia. Nada disso, como se sabe, acontece no
universo do terrorismo. É exatamente por esse motivo que é relevante para o mundo analisar o tratamento moral e jurídico que as democracias – e os Estados Unidos entre elas, é claro – dão à tortura. Infelizmente, a discussão sobre sua eficácia contém uma armadilha. Lembra a célebre “parábola da bomba-relógio”: o terrorista preso sabe onde está a bomba que, em pouco tempo, vai explodir e matar milhares de inocentes. É moralmente aceitável torturá-lo para que revele onde está a bomba e assim salvar vidas inocentes?
Isso é uma fábula”, diz o filósofo francês Michel Terestchenko, autor de O Bom Uso da Tortura, em que discute a prática dos suplícios da atualidade. Fábula porque a parábola não existe na vida real. Primeiro, é preciso ter certeza de que há uma bomba. Segundo, ter certeza de que o terrorista sabe onde ela está. Terceiro, ter certeza de que, uma vez torturado, o terrorista dará a informação correta. No mundo insondável do terror, a certeza tríplice é uma quimera. Por trás da charada – assim como por trás da eficácia dos suplícios –, esconde-se uma tentativa de legitimar a tortura. Escreveu o jornalista Elio Gaspari em A Ditadura Escancarada , livro em que disseca a tortura sob o regime militar no Brasil: “É um truque de lógica. Finge demonstrar a necessidade da tortura quando, na realidade, o que busca é a sua inimputabilidade”. É claro que a tortura, às vezes, é eficaz. Em outras, é ineficaz. Mas em qualquer situação é crime. (PETRI, Andre. Rev. Veja: 19/12/2012, p. 130-132.)
Altera-se profundamente o sentido do enunciado no texto com a substituição do nome substantivo em destaque por qualquer dos nomes propostos em: