O caso dos mecânicos que sabiam ler
Segundo alguns historiadores, houve dois sacolejões maiores na história da humanidade. O resto foi tremelique. O primeiro foi domesticação dos cereais – começando com o trigo selvagem. Com isso, gerou-se uma relativa abundância de alimentos, o que permitiu tribos, até então nômades, sedentarizarem-se. As cidades trouxeram densidade humana requerida para o fermento da criatividade e para inúmeras atividades produtivas e artísticas. Afirma-se que elas foram a grande inovação de todos os tempos. Mas a agricultura induziu o seu desenvolvimento.
A segunda transformação drástica foi a Revolução Industrial. Um tecelão, em Constantinopla, trabalhava três horas para comprar um pão de meio quilo – o mesmo que na Roma de César. A partir de 1600, o tempo baixou para duas horas. Hoje são necessários cinco minutos. Esse espantoso salto de produtividade tornou possível oferecer a todos um padrão digno de vida.
Mas por que a Revolução Industrial aconteceu na Inglaterra, no século XVIII?
Há uma nova explicação, curiosa e persuasiva. Como resultado do desenvolvimento das escolas inglesas, pela primeira vez na história apareceram mecânicos capazes de ler artigos científicos. E também de se corresponder com colegas e pesquisadores.
Os bons mecânicos sabiam lidar com máquinas e construir toda espécie de engenhoca. Mas aos que tinham novas ideias faltavam o horizonte intelectual e a motivação para implementá-las.
No mundo das sociedades científicas de então, os pesquisadores elucubravam, mas não sabiam fazer coisas, não conheciam a manufatura. Portanto, os avanços do pensamento não tinham pontes para o mundo da indústria.
É então que entram em cena os mecânicos-leitores. Na ânsia de ficarem ricos, começaram a escarafunchar o que escreviam os cientistas. Como tinham amigos com interesses similares, trocavam cartas, discutindo seus projetos.
Perceberam que, se inventassem, se inovassem, poderiam abrir empresas e que patentes poderiam proteger suas novidades. Os tais mecânicos-leitores começam a inovar, criando bombas a vapor, teares e uma infinidade de pequenas invenções que permitem os grandes saltos subsequentes.
Portanto, os mecânicos-leitores foram diretamente os responsáveis por uma das duas mais importantes transformações da humanidade. Sugestivo, pois não?
(Claudio de Moura Castro. Revista Veja. 11.12.2013. Adaptado)
O termo destacado na frase – No mundo das sociedades científicas de então, os pesquisadores elucubravam,
não sabiam fazer coisas, não conheciam a manufatura. – pode ser corretamente substituído, mantendo-se a relação de sentido estabelecida, por: