Leia o texto a seguir:
Nada como a instrução
“Rico estuda cinco anos mais.”
Cotidiano,17 jul.1998.
O senhor não me arranja um trocado?, perguntou o esfarrapado garoto com um olhar súplice. Outro daria o dinheiro ou seguiria adiante. Não ele. Não perderia aquela oportunidade de ensinar a um indigente uma lição preciosa:
– Não, jovem – respondeu –, não vou lhe dar dinheiro. Vou lhe dar uma coisa melhor do que dinheiro. Vou lhe transmitir um ensinamento. Olhe para você, olhe para mim. Você é pobre, você anda descalço, você decerto não tem o que comer. Eu estou bem vestido, moro bem, como bem. Você deve estar achando que isso é obra do destino. Pois não é. Sabe qual é a diferença entre nós, filho? O estudo. As estatísticas estão aí: Pobre estuda cinco anos menos do que o rico.
O menino olhava, assombrado. Ele continuou:
– Pessoas como eu estudaram mais. Em média, cinco anos mais. Ou seja: passamos cinco anos a mais em cima dos livros. Cinco anos sem nos divertir, cinco anos queimando as pestanas, cinco anos sofrendo na véspera dos exames. E sabe por quê, filho? Porque queríamos aprender. Aprender coisas como o teorema de Pitágoras. Você sabe o que é o teorema de Pitágoras? Não, seguramente você não sabe oque é o teorema de Pitágoras. Se você soubesse, eu não lhe daria um trocado, eu lhe daria muito dinheiro, como homenagem a seu conhecimento. Mas você não sabe o que é o teorema de Pitágoras, sabe?
– Não – disse o menino. E virando as costas foi embora.
Com o que ele ficou muito ofendido. O rapaz simplesmente não queria saber nada acerca do teorema de Pitágoras. Aliás – como era mesmo, o tal teorema? Era algo como o quadrado da hipotenusa é igual à soma dos quadrados dos catetos. Ou: o quadrado do cateto é a soma dos quadrados da hipotenusa. Ou ainda, a hipotenusa dos quadrados é a soma dos catetos quadrados. Algo assim. Algo que só aqueles que têm cinco anos a mais de estudo conhecem.
(Moacyr Sclilar. O imaginário cotidiano. São Paulo: Global,2001. p.25-6.)
A crônica é um gênero textual que oscila entre literatura e jornalismo. A crônica de Moacyr Scliar acaba por revelar:
I - insólida, por causa de seu final surpreendente.
II - crítica, porque denuncia as diferenças sociais.
III - irônica, porque demonstra que o conhecimento escolar nem sempre é suficiente para que se tenha uma visão abrangente da realidade.
Qual(is) afirmativa(s) está(ão) correta(as)?