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Texto I
Francisco, os gays e a doutrina
“Se alguém que é gay procura Deus e tem boa vontade, quem
sou eu para julgá-lo?” A declaração do Papa Francisco,
pronunciada durante uma entrevista à imprensa no final de sua
visita ao Brasil, ecoou como um trovão mundo afora. Nela, existe
mais forma que substância – mas a forma conta.
A homossexualidade é um tabu no Vaticano. Bento XVI, o
antecessor de Francisco, escreveu apenas oito anos atrás que a
homossexualidade é uma “desordem objetiva” e “uma forte
inclinação dirigida para um pecado mortal intrínseco”. Francisco
não contestou Bento XVI – e talvez concorde com ele. Contudo,
usou o termo coloquial “gay”, algo antes impensável, e colocou o
acento em outro lugar: “Quem sou eu para julgá-lo?”
Francisco deslocou o problema. Sob a lógica de sua
declaração revolucionária, o problema não é de substância (ser
gay), mas de circunstância (viver à luz de Deus). Ele não foi além
disso. Entretanto, nas dioceses distantes, a frase provocará
debates, e muitos a interpretarão como uma licença implícita
para ordenar padres que são gays, mas celibatários. “Não fale,
não pergunte”: essa foi a orientação de Bill Clinton que começou
a abrir as portas das forças armadas americanas aos gays.
Francisco disse quase o mesmo.
“Quem sou eu para julgá-lo?” – isso, dito pelo Papa, não é
pouca coisa. O impacto da declaração não está confinado às
fronteiras da Igreja. Em dezenas de países, especialmente nos da
África, existem leis contra gays. A Rússia de Vladimir Putin acaba
de criar uma lei desse tipo. Estados e governos querem a
prerrogativa de “julgar” – e de punir! – a orientação sexual das
pessoas. Quando a Igreja ensaia rever sua anacrônica posição
sobre os homossexuais, algo de relevante está acontecendo.
Na África do Sul, o arcebispo anglicano Desmond Tutu, uma
das mais destacadas figuras da luta contra o apartheid, lidera
uma campanha internacional de denúncia das leis antigays. Ele
declarou que repudiaria “um Deus homofóbico”. Francisco ficou
bem longe disso, mas suas palavras anunciam o fim de um tempo
de escuridão. A pergunta que emerge delas é bem simples: se o
Papa não tem o direito de “julgar” os gays, quem são as
autoridades políticas para fazê-lo?
(Axé Silva, O Mundo, setembro 2013)
Texto II
Nos reinos da intolerância
A intolerância sexual reverberou na Casa Branca e no
Vaticano. O presidente Barack Obama criticou os países que
adotam leis discriminatórias contra homossexuais. “Não tenho
nenhuma tolerância com os países que tentam tratar gays,
lésbicas ou pessoas transgênero de uma maneira que os intimide
ou prejudique”, declarou. Já o Papa Francisco distinguiu-se de
seus antecessores, explicando que não tem o direito de julgar as
inclinações sexuais dos indivíduos.
Normatizar o comportamento sexual de um indivíduo, algo
que só pertence a ele, constitui uma das formas mais cruéis de
violência. Cada ação política nessa direção potencializa a
discriminação e o ódio sexual. Obama entendeu isso e até o Papa
ensaiou uma mudança na tradicional posição doutrinária da
Igreja. Entretanto, a política da intolerância continua a imperar
nos países que negaram o valor dos direitos individuais.
(Axé Silva, O Mundo, setembro de 2013)
As opções a seguir apresentam argumentos encontrados nos textos I e II, contrários, de forma implícita ou explícita, à homofobia, à exceção de uma. Assinale-a.