O trecho abaixo é um fragmento de uma das entradas do diário de Carolina Maria de Jesus, importante escritora nacional. Na edição de seu livro, foi completamente respeitado o registro de linguagem por ela empregado ainda que, por vezes, contrariasse a tradição gramatical. Leia-o, com atenção, para responder à questão.
Texto I
29 DE MAIO Até que enfim parou de chover. As nuvens deslisa-se para o poente. Apenas o frio nos fustiga. E varias pessoas da favela não tem agasalhos. Quando uns tem sapatos, não tem palitol. E eu fico condoida vendo as crianças pisar na lama. (...) Percebi que chegaram novas pessoas para a favela. Estão maltrapilhas e as faces desnutridas. Improvisaram um barracão. Condoí-me de ver tantas agruras reservadas aos proletarios. Fitei a nova companheira de infortunio. Ela olhava a favela, suas lamas e suas crianças pauperrimas. Foi o olhar mais triste que eu já presenciei. Talvez ela não mais tem ilusão. Entregou sua vida aos cuidados da vida.
... Há de existir alguem que lendo o que eu escrevo dirá... isto é mentira! Mas, as miserias são reais.
... O que eu revolto é contra a ganancia dos homens que espremem uns aos outros como se espremesse uma laranja.
(JESUS, Carolina Maria de. Quarto de despejo, diário de uma favelada. São Paulo: Ática,1993, p.41)