A carta, essa personagem central dos últimos séculos, foi solapada pelo e-mail e sumiu sem que nos déssemos conta, sem que pudéssemos velá-la ou guardar luto. Partiu da vida para entrar na história e não deixou, vejam só, sequer uma carta de despedida.
Claro que ainda nos chegam envelopes por baixo da porta, mas não passam de tristes arremedos das gloriosas folhas de papel que outrora relataram o descobrimento de continentes, alimentaram amores impossíveis, aproximaram amigos distantes; ringues nos quais travaram-se as mais apaixonadas pelejas intelectuais.
Quem mais perdeu com a morte da carta não foi a amizade, meus caros, não foi o amor nem a profundidade: o grande órfão do declínio postal foi o carteiro, esse distinto profissional que em sua época áurea era um pouco enfermeiro, bombeiro, cupido, trazendo em sua bolsa verde a preciosa literatura cotidiana.
Havia uma ingenuidade na figura do carteiro, algo que pertencia essencialmente ao século XX e que não cabe no XXI: um homem a pé ou de bicicleta que vinha entregar à mão um bilhete escrito também à mão. Tudo isso se foi com um clique. Para o nosso bem, é verdade, mas se foi; era bonito e deve, portanto, ser lembrado.
(Adaptado de Antonio Prata. Folha de S.Paulo, 06/06/2012)
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