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Escravos de latas e fios
O homem sempre construiu máquinas e as máquinas acompanham as sociedades humanas desde a Antiguidade. Mas só há 200 anos elas tiveram um grande aperfeiçoamento, quando se investiu maciçamente na criação de motores a vapor, de máquinas elétricas e à explosão e depois de sistemas que sofisticaram esses equipamentos e foram tornando a sociedade cada vez mais cheia de utensílios e aparelhos.
Máquinas de escrever, de gravar de sons, de gelar, de cozinhar, de costurar, de imprimir, de alterar o ambiente, de produzir energias, máquinas de todo tipo foram constituindo um mobiliário cotidiano e dando a impressão de que com elas se obteria cada vez mais conforto e bem-estar.
Aí está o sonho do homem que viveu há mais de 200 anos: uma variedade de equipamentos mecânicos e elétricos à sua disposição, conduzindo a certo tipo de paraíso no qual não se precisaria fazer quase nada. Todos os trabalhos, pesados ou leves, grandes ou pequenos seriam, de uma forma ou de outra, realizados por equipamentos. Era um sonho não precisar de escravos ou pessoas para servir e estar tudo ao alcance da mão à medida que desse apenas um piparote.
O mesmo princípio alimenta hoje a indústria da robótica na ilusão de criar máquinas ainda mais sofisticadas que o homem, inclusive na capacidade de pensar. Existe um grupo de pesquisadores norte-americanos que investe grandes somas de dinheiro em estudos para desenvolver sistemas eletrônicos tais que não só se equiparem mas ultrapassem o homem, atingindo uma perfeição que este nunca teve, a perfeição absoluta em termos de sistemas de inteligência.
(...) As máquinas foram se tornando familiares ao homem e o homem foi delegando cada vez mais atribuições a elas, deixando, ele mesmo, de ter experiência, vivência e conhecimento das coisas que a máquina "faz" por ele.
Em certo sentido, o aumento das máquinas significou também um empobrecimento do homem. Há certos ramos profissionais em que os especialistas possuem tantas máquinas à disposição que cada vez menos pesquisam, cada vez menos conhecem em profundidade os fatos de sua profissão, cada vez mais ignorantes são (...).
Mas o que mais marca o período "tecnocêntrico" de nossa cultura é o aparecimento, junto com todos os sistemas técnicos, mecânicos, elétricos, de produção, trabalho e bem-estar, de um campo de utilização desses equipamentos que se tornou cada vez mais totalizador. É o uso da tecnologia de comunicação e informação. Elas vieram como uma espécie de contraponto a uma sociedade que se torna cada vez menos social, onde as pessoas cada vez menos se falam, encontram-se, veem- se, tocam-se; em que as pessoas têm cada vez menos tempo para as outras, para os amigos; uma sociedade, portanto, de progressivo isolamento.
A comunicação, como espaço de troca de sensações, vivências, informações com o outro, hoje é "realizada" por meios de aparelhos e máquinas eletrônicas. As tecnologias tentam artificialmente reagregar um mundo de contatos humanos que na prática já está totalmente rarefeito, pulverizado.
(Ciro Marcondes Filho. Sociedade tecnológica. Adaptado)
O texto de Ciro Marcondes, como um todo, está voltado para a proposta de